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O ator Flávio Migliaccio tirou a própria vida esta semana, aos 85 anos. Em seu bilhete suicida, ele escreveu: “Me desculpem, mas não deu mais. A velhice neste País é o caos como tudo aqui. A humanidade não deu certo. Eu tive a impressão que foram 85 anos jogados fora num país como este. E com esse tipo de gente que acabei encontrando. Cuidem das crianças de hoje! Flavio.” Esse bilhete me deixou reflexivo. E, como cristão, me senti responsável por ele ter chegado ao fim da vida tão deprimido. Falhei, por não fazê-lo saber algumas realidades que poderiam tê-lo sustentado.

Primeiro, quando Flavio mostra a decepção por a humanidade não ter dado certo, fico triste, pois quem conhece a Escritura sabe disso desde Gênesis 3. Que cristão acredita que a humanidade deu certo? Todos sabemos que caímos, transgredimos, falimos. Por outro lado, essa percepção não espanta nenhum de nós, pois sabemos que essa falência tem prazo de validade. Na cruz, fomos resgatados. Há redenção. E, na volta de Cristo, haverá glorificação. Não somos surpreendidos ou deprimidos por a humanidade ter dado errado. Ela deu. Mas, no fim, isso será revertido.

Segundo, Flavio teve a impressão de que foram 85 anos jogados fora. Que triste ler isso. Porque jamais uma vida é jogada fora se há propósito, motivação, razão de ser. E ter Cristo em nossa vida nos estimula a amar o próximo, o que, quando feito com diligência, nos dá completude no senso de utilidade e valor pessoal. Quem dos que dedicam a vida a amar o semelhante e servi-lo sente que está desperdiçando tempo? Acordar de manhã desejando realizar algo para fazer alguém sorrir e ir para a cama à noite sabendo que se ajudou alguém a viver proporciona uma sensação de plenitude e propósito que nos fazem ver cada segundo da existência como preciosidade.

Terceiro, Flávio se mostra decepcionado com as pessoas, “esse tipo de gente”. Todo ser humano conviverá com pessoas horríveis. Entro nas redes sociais e vejo multidões de pastores e membros de igrejas grosseiros, brigando por política ou teologia, ofendendo uns aos outros, arrogantes e desagradáveis. Como conviver com isso? Eis o segredo: perdoando. Na nossa fé, somos instados a perdoar “esse tipo de gente” por entender que não sabe o que faz e está escravizada por seu pecado. E a instrui-la, com mansidão e paciência. Por quê? Por crer que, se até mesmo pastores e teólogos famosos, arrogantes e agressivos podem vir em algum momento a ser salvos por Jesus, quanto mais qualquer outra pessoa! Sim, crer na redenção até do mais endurecido religioso dá esperança de salvação “dessa gente”. Qualquer que seja.

Sim, eu falhei. Falhei com Flavio porque não lhe apresentei o senso de propósito que há no amor a Deus e ao próximo. Falhei por não mostrar que a falência da humanidade em Gênesis 3 terá reversão em Apocalipse 22. Falhei por não mostrar que há perdão e restauração para toda gente horrível. Falhei porque o cristo que ele conheceu foi o falso, o genérico, aquele que milita na política partidária e nos programas de televisão com ódio, arrogância, estupidez, palavreado destemperado e falta de amor nas palavras. E, desculpe, você também falhou. Todo cristão falhou. Porque perdemos tempo com vãs discussões em vez de investi-lo em fazer gente como Flávio Migliaccio conhecer o Cristo verdadeiro: o que ama, redime, conserta, restaura, controla, pacifica e estende a mão. O Cristo da cruz e da sepultura vazia.

Falhamos com Flavio. Mas há milhares de outros flavios ao nosso redor, em situação bem parecida com a dele. A grande pergunta é: o que você pretende fazer a respeito?

Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício Zágari
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“Quem é o seu teólogo favorito?”. Essa pergunta me foi feita recentemente por uma irmã que participou de um bate-papo ao vivo que organizei em meu facebook (uma “live”, como se costuma chamar), para falar sobre livros de ficção cristã, por conta do lançamento, mês passado, de meu mais recente livro, Sete enigmas e um tesouro (editora Mundo Cristão). Não tive dúvidas: na mesma hora, respondi: “Meu teólogo favorito é a dona Maria”. Diante das reações de espanto dos amigos que participavam do bate-papo virtual, que esperavam nomes como Tim Keller, Agostinho ou Dooyeweerd, expliquei quem é essa grande e profunda teóloga. Gostaria de lhe falar sobre isso também.

É muito comum, quando se fala de teologia, pensar-se que um “grande teólogo” é um acadêmico. Aquela pessoa que tem muitos livros escritos e que dá aula em seminário teológico, além de palestras em conferências e congressos. Sem desmerecer os queridos irmãos que se encaixam nessa descrição, não considero esse o perfil de um “grande teólogo”. O “grande teólogo” é, para mim, aquela pessoa que consegue viver tudo o que a teologia cristã abarca com real profundidade e intimidade com Deus.

Pobreza, ou pequenez, de conteúdo, em se tratando do evangelho, não é a ausência de parâmetros acadêmicos. Muitos teólogos transbordantes de conhecimento intelectual são pobres no conteúdo cristão e muitos irmãos e irmãs com pouca bagagem teológica formal são ricos no conteúdo do evangelho que propagam. Riqueza de conteúdo cristão não significa capacidade de decorar o que dezenas de pensadores e teólogos disseram ou escreveram. Isso é acúmulo de conhecimento, o que é excelente e deve ser feito, mas não é pré-requisito para uma mensagem cristã ser rica. Em Cristo, riqueza pode vir da simplicidade.

Uma mensagem rica em conteúdo cristão é qualquer uma, simples ou complexa, que enxergue o cerne do evangelho e consiga transmitir para o interlocutor os valores e conceitos vitais do reino, sobre os quais a boa-nova de Cristo está alicerçada. Mensagens notoriamente simples, coloquiais e acessíveis no conteúdo podem carregar enorme profundidade teológica cristã. Ou você crê que os extremamente simples Sermão do Monte e parábolas de Jesus são rasos, superficiais e pobres em sua mensagem?

A realidade é que ser simples não é ser pobre. E ser rebuscado não é ser rico. Há teólogos que carregam gigantesca bagagem intelectual mas que usam seus muitos conhecimentos a fim de menosprezar pessoas e grupos dos quais discordam. Falam com muito conhecimento acadêmico, mas o que suas palavras geram são dissensões, menosprezo, ódio e arrogância — tudo, vícios condenados biblicamente. Nesse sentido, sua mensagem é, apesar de rebuscada, paupérrima. Embora a ignorância acerca do conhecimento teológico acadêmico não seja em nada desejável, por definição bíblica um analfabeto pode ser muito mais rico em seu conteúdo espiritual do que um PhD em Teologia, desde que ele transborde em devoção, piedade e temor resultante de riquezas relacionais com Jesus.

As palavras de Paulo em Colossenses 3.12-16 nos mostram o que profundidade teológica significa: possuir conteúdo transbordante de compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência. Compreensão. Perdão. Um diálogo teológico cristão rico e profundo em sua mensagem é o que ocorre entre pessoas que deixam a paz de Cristo governar seu coração, e não que recorrem à sua vasta bagagem intelectual a fim de esmagar o adversário debaixo dos pés de seus argumentos retóricos bem construídos. Derrotar, afinal, não é a meta – edificar é. Precisamos de menos machões briguentos e arrogantes nos diálogos teológicos e precisamos de mais pessoas que consigam dialogar com o diferente demonstrando as virtudes do fruto do Espírito. Não custa lembrar quais são elas: Mansidão. Amor. Paz. Amabilidade. Domínio próprio. Alegria. Fidelidade. Paciência. Bondade. Isso é riqueza no conteúdo da mensagem. É profundidade. E é grandeza.

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Dona Maria não é uma pessoa real. É uma personagem que criei para representar as muitas pessoas que cruzaram meu caminho e que são simples em seus conhecimentos acadêmicos sobre a teologia cristã, mas riquíssimas em sua aplicação da teologia cristã em sua relação com Deus e o próximo. Dona Maria é o irmão Tinoco, a irmã Célia, o pastor Luiz e tantos outros anônimos que me ensinaram com profundidade ímpar o que significam o cristianismo e o ser cristão.

Por outro lado, cruzaram minha vida ao longo dos anos pessoas dotadas de títulos extensos e pomposos; com fama entre os evangélicos; dotados de memórias prodigiosas para decorar nomes de autores, teólogos, filósofos, citações e trechos de livros, mas cujo impacto transformador na minha vida foram neutros ou, até, extremamente negativos. Esses, apesar de seus muitos predicados, não considero “grandes teólogos”. São apenas cristãos cheios de conhecimento, mas rasos e pequenos em seu temperamento, em sua piedade, em seu exemplo, em sua autopercepção e na manifestação do amor cristão.

Meu irmão, minha irmã, não se satisfaça com o pouco conhecimento da teologia acadêmica. Busque, sempre, adquirir mais e mais bagagem intelectual, penso que Deus se agrada disso. Porém, se esse conhecimento vier despido de piedade, intimidade com Cristo, amor visceral ao próximo, humildade (vivida e não fingida) e abnegação, tenha a certeza de que você jamais será um “grande teólogo”. Aliás, pensando bem, não procure ser um “grande teólogo”, mas, sim, um cristão humilde e que aplica a teologia na prática da vida, para edificar a Igreja e glorificar a Deus, assassinando a cada nova manhã o seu próprio ego. Se formos assim, aí sim, a nossa teologia terá valido para alguma coisa além de alimentar o nosso gordo ego teológico.

Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício Zágari < facebook.com/mauriciozagariescritor >
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